SALA DE ESTUDOS

[59] 18/11/2017

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Tomei um tempo para iniciar o que tinha de fazer. Nem esperei em demasia, nem me apressei em excesso. Tinha comigo a presença da espera dos demais, e a responsabilidade sobre minha ação e seus efeitos em tantos outros. Não podia assim mensurar meu cansaço, nem ceder às minhas dúvidas. Tampouco parecia inteligente me guiar por minha ânsia, ela podia por tudo a perder com o olhar no final e o descuido com os detalhes. Ainda assim, atentar demais aos detalhes podia tomar um tempo que eu não tinha, e pôr em risco todo um processo complexo, para o qual demanda uma certa desenvoltura. Tão logo iniciei, e o que havia de segurança em mim sumiu como se ali nunca houvesse existido, e com ela a própria certeza da minha existência. Nesse fazer está implicado meu ser, meu futuro e meu passado, meu nome e minha honra. Não era hora de se pôr em dúvida. Alguns segundos haviam se passado e eu estava a pensar que pensava demais, e que essa censura podia pôr tudo a perder. Me pus a afirmar toda a minha experiência, e que se ali estava não era por um acaso do destino, mas o resultado de uma soma complexa onde meus méritos eram mais do que suficientes para alavancar essa equação e me colocar nessa situação. Era eu quem estava ali. Não podia perguntar, embora em certa medida estava a fazê-lo, se seria eu a pessoa certa a realizar tal ação, se não teria sido uma melhor escolha me juntar aos demais, e fazer votos que o escolhido era a pessoa certa, e que essa não era eu. A história faz parecer que quem está à frente é vitorioso. Mas se se olhar com atenção esses são os primeiros a morrer, a sofrer. Depois da foto, depois do registro, logo após a virtude, vem o sofrimento. Talvez eu esteja exagerando, talvez devesse concentrar minha atenção no presente, e não buscar nenhum resultado. Talvez devesse acreditar que o talvez seja o regente da vida: até que algo de fato aconteça, tudo é um talvez. E depois que acontece, talvez seja entendido de uma forma, talvez seja entendido de outra. Na história podemos ser heróis ou carrascos, talvez um ou outro, a depender quem é o tal da vez a conta-la. De repente me vi desaparecido, e já não sabia porque estava ali. Me vi simplesmente fazendo algo, sem saber porque havia começado, nem a quem me direcionava, e se por acaso alguém me esperava. Talvez inventamos uma complexa história para dar conta de algo que nos falta, ou de um excesso de fragilidade. Talvez nos falte confiar na força dessa fragilidade. Já não tinha certeza se tinha começado algo, se tinha certezas, e se havia algo por terminar. Dentre o que sei agora, me parece que o término é a morte, simplesmente porque tudo o que sei vai até ali – ao menos até onde me contaram os vivos.

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