CONFISSÃO IMPESSOAL

Escrevo para procurar, não para dizer. Me perco para encontrar, não para me encontrar. Ando a pesquisar com escritas que funcionam como exercícios via jogos que intentam possibilitar improvisações de e em espaços, corpos e coisas. Tais espaços, corpos e coisas podem ou não ter utilidade, dependendo de por quem, como e quando serão encontrados. A mim servem como experimentos. Esse mim que a mim pouco importa como fim (mesmo?!). São entremeios: imagens, textos. Escrita que se escreve para inventar(se). Escolha de estar em cena sem roteiro. Há, em verdade vos digo, o sincero interesse em dar testemunhos de uma vida: porém, não a de um indivíduo que vive nela, mas de uma vida que pode viver-se neste indivíduo  — que muda ao tom da própria vida. Inventar-se em corpo que funciona como uma maquinaria vidente que apresenta forças vitais sem ele imperceptíveis (pois somente um corpo múltiplo, potencial, pode captar as singularidades que percebe em dado ponto de perspectiva — pontos, mutabilidade). A pessoa aqui, por si, se apaga (embora teime em não sumir de fato). Do “meu” corpo, então, prospecto que possa ser uma mistura insensata de coisas heterogêneas. Trata-se, portanto, de um exercício esgotante de variar o que me constitui, de tentar sair, quase sempre sem sucesso, de versões pouco potentes de mim mesmo; destituir a centralidade do que sei, e em certa medida esquecer, em virtude de saberes por vir. Assim, me jogo num pesquisar em constantes exercícios experimentais, sempre a espreita de constituir a perspicácia necessária para, como disse Henry Miller, “poder viver a sabedoria de não ser senão o último dos idiotas”. Suponho que assim possa fazer jus às vidas que em mim podem viver-se, nada perco se estiver errado.

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