SALA DE ESTUDOS

[76] 22/01/2018

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Nota que aponta para esta: [10]

 

Essa fatalidade (não há foto sem alguma coisa ou alguém) leva a fotografia para a imensa desordem dos objetos – de todos os objetos do mundo: por que escolher (fotografar) tal objeto, tal instante, em vez de tal outro? A fotografia é inclassificável porque não há qualquer razão para marcar tal ou tal de suas ocorrências; ela gostaria, talvez, de se fazer tão gorda, tão segura, tão nobre quanto um signo, o que lhe permitiria ter acesso à dignidade de uma língua; mas para que haja signo, é preciso que haja marca (BARTHES, 1984, p.16).

Barthes me remete novamente ao texto, não por acaso: buscava um aliado que comigo pudesse delinear o início (mesmo que me abandonasse depois). Não sei se ele continuará, mas provavelmente não, pois não estava no meu itinerário de leituras atuais. Contudo, estar com ele de alguma maneira me motiva a escrita – seus textos movem em mim algo que me convoca à escritura.

Foi então de minha parte um ato calculado. Não me oponho ao cálculo, aos objetivos, à razão. E mesmo, por vezes, aceito que os fins justificam os meios. O que está em jogo aqui é que o jogo é soberano e nele criamos nossas estratégias – e nestas valem os fins como um mover-se de um ponto ao outro, para sair do estático, desde que entenda que este ponto faz farte de um desalinhar ao infinito.

Assim estruturo a escrita (e a desestruturo) em um planejamento que não é mais do que a tentativa de antever: uma visão, uma miragem que pode se confirmar como realidade – se por fim for composta de fato como antevisto, ou pode cair no esquecimento (para que possivelmente retorne depois, tendo em vista que o esquecimento não é desaparecimento, no máximo um desaparecimento da visão).

Encontro então em Barthes forças para retornar a escrita, pois assim havia previsto (conforme esboçado no fragmento anterior a este, e que, por sua vez, surgiu ao acaso [link, creio que seja o que cita Guattari (06/03)). De tempos em tempos – em espaços percorridos, portanto – sinto ser necessário fechar certo bloco de notas dentro desse Bloco de Notas (assim agora chamado conforme decisão recente e explicitada em textos ainda por serem escritos, mas que se iniciam por aqui…).

A questão então, desviando da fotografia para a escrita (para a pesquisa-texto): de todos os objetos do mundo, por que escolher tal objeto e tal instante ao invés de outro?

E, a partir disso, e para além, perguntar: quem é esse que escolhe? E aí inserimos o problema da autoria, da escrita, da linguagem, e desse jogo entre sujeito e devir, estratos e fora, que tanto nos interessa.

Ao escrever o que escrevemos, e ao empregar determinadas palavras, e não outras, fizemos escolhas. Essas escolhas por sua vez apresentam determinada imagem de pesquisa. Os usos da língua, as marcas deixadas na página em branco, dizem tal mundo ao invés de outro. Essa é uma questão de pesquisa, da definição do que se quer pesquisar e do que (e como) se pretende apresentar; mas é, ao mesmo tempo, a questão do improviso: entre o que passa num dado momento, qual ação realizo? Em quais possibilidades afirmo minha existência? Qual gesto, qual palavra? O que mostro e o que não dou a ver? Mas antes, quais possibilidades sou capaz de perceber? E aí retornamos ao Corpo Potencial: deste e da potência como latência de possibilidades, como quem percebe os movimentos nos quais pode se inserir e compor. Esse que percebe e faz boas escolhas, faz boas composições, é um bom inventor e escreve boas ficções.

É preciso (e impreciso, sem ressalva) saber escolher, bem como realizar boas alianças (e alinhanças): precisamos se aliar, fazer amigos e ser nossos próprios inimigos, porquanto é necessário combater um tanto de si, do sujeito, para possibilitar fluir os fluxos que vitalizam a vida – com a ajuda desses outros que nos dão forças ao mesmo tempo que nos deslocam (e a dinâmica do movimento inicia ao sair do eixo).

E assim iniciamos mais uma nota, abrindo o portal da invenção, jogando com o que surge, e com os textos já lidos, com conexões mais ou menos imprecisas enquanto definição de um roteiro, mesmo assim preciosas nas marcas que deixam, e nos efeitos que produzem (falamos acerca da nossa leitura, com fé de que seja potente para outros leitores também).

Seguimos para outras notas, até durar o estoque.

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