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[28] 29/09/2017

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A substância da leitura (solicitação e excitação) é a citação; a substância da escrita (reescrita) é ainda citação. Toda prática do texto é sempre citação, e é por isso que não é possível nenhuma definição de citação. Ela pertence à origem, é uma rememoração de origem, age e reage em qualquer tipo de atividade com o papel. Mas o modelo da citação está na origem – arcaica (o jogo da criança) e atual (o incipit) – da escrita, ele está também, por isso mesmo, em seu horizonte: o texto ideal, utópico, aquele com o qual sonhou Flaubert, seria uma citação. A utilização de uma citação como epígrafe substitui esse ideal, deformando-o. E na impossibilidade de realizar o ideal, o livro se contenta em ser a reescrita de uma citação inaugural que por si só seria suficiente. (COMPAGNON, 2007, p.42)

Tudo é texto. Nesse contexto, afirmar uma busca, ainda que dispersa, pelo que me toca, pela textura que me excita, uma tessitura que me envolve, e que me tece. Aqui também são corpos, o meu e o do texto, portanto, encontros: tudo são encontros, sempre algo nos toca, sempre algo termina e começa, tudo é fronteira; fronteiras dentro de fronteiras de corpos cada vez menores; corpos dentro de corpos[ ]. O livro: um corpo; um capítulo, um corpo dentro de um corpo; uma página, um parágrafo: corpos dentro de corpos; a frase, a palavra… a pele dos meus dedos que tocam as teclas que digitam as letras: corpos; meu ante-braço, meu braço (um ante-ombro?), ombro, pescoço, cabeça… cérebro, células, pensamentos, sensações: corpos. Tudo é corpo[ ].

Um texto que me solicita é aquele para o qual não necessito compreensão, não necessito explicar, tampouco é preciso que o expliquem a mim – é uma paixão, um encontro que precede e excede a razão. Excitação. Todavia, a excitação[ ] é um excesso, um além de um estado “normal”, equilibrado. Aí então se estabelece um jogo entre esforço e prazer: de citação em citação, em cada repetição que se difere, eventualmente (um acontecimento), encontro o que me excita: um prazer que de modo algum justifica o esforço, pois o prazer não é o objetivo final, é uma diversão: outra versão do “meu” corpo.

O esforço não precisa ser justificado, quiçá, explicado. Esse esforço implica na condução do meu corpo de um encontro a outro, cruzando fronteiras[texto sobre liberdade e improvável escrito em Recife]. É preciso descolar da ideia de esforço da de trabalho forçado, de obrigação, de agência externa. Sou eu que me esforço, que me ponho em movimento, que me ponho em jogo, e esse esforço já contém em si doses sutis de prazeres.

Esse texto então, esses múltiplos corpos agenciados através da linguagem, não busca ser mais do que um esforço, uma viagem[ ], uma caminhada, o contato com diferentes corpos, encontros compositivos: uma reescrita de vida, uma reescrita de um trecho de uma vida, de um período, de um dia, de um momento. A vida em texto. Se tudo é texto, a vida aqui, e ali, se tece.

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