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[18] 22/08/2017 – 08/09/2017

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JOGO

O primeiro jogo, um jogo que se desdobra em vida, que “compreende a existência a partir de um instinto de jogo, faz da existência um fenômeno estético” (DELEUZE, 1976, p.11). Este é o grande jogo, a dança de Shiva, a roda da fortuna, Dionísio jogando com Apolo, Aión com Kronos, Hermes na encruzilhada. Jogo inevitável, que pode ser jogado com prazer e vontade, e que pode ser jogado com desgosto e passividade. Não há um destino ou, se há, ele também se compõe em jogo com o acaso.

A este jogo “maior”, Deleuze (2007, p.62) define os princípios:

1º) Não há regras preexistentes, cada lance inventa suas regras, carrega consigo suas próprias regras. 2º) Longe de dividir o acaso em um número de jogadas realmente distintas, o conjunto das jogadas afirma todo o acaso e não cessa de ramifica-lo em cada jogada. 3º) As jogadas não são pois, realmente, numericamente distintas. São qualitativamente distintas, mas todas são as formas qualitativas de um só e mesmo lançar, ontologicamente uno. (…) O único lançar é um caos, de que cada lance é um fragmento. Cada lance opera uma distribuição de singularidades, constelação. É o jogo do problema, dos problemas e da pergunta, não mais do categórico e do hipotético. 4º) Um tal jogo sem regras, sem vencedores nem vencidos, sem responsabilidade, jogo da inocência. (…). O jogo ideal de que falamos  não pode ser realizado por um homem ou por um Deus. Ele só pode ser pensado e, mais ainda, pensado como não-senso. Mas, precisamente: ele é realidade do próprio pensamento. É o inconsciente do pensamento puro.

É então o jogo do problema e das perguntas. Não se trata de respostas, mas, sobretudo, das perguntas. De perguntar e de fazer a pergunta correta. A resposta são pontos provisórios num jogo que se desdobra, são pontos de uma linha que segue, linha de vida.

É um jogo que se dá no pensamento, mas aqui é indispensável reafirmar que pensamento é corpo, que tudo é corpo. E do corpo que pensa a si, que joga consigo, a ideia de um Corpo Potencial. Jogo da inocência e do acaso. Aqui a vida está por um fio, e não há receio de cair no abismo, não há abismo: se outrora se pensava na insegurança do frágil equilíbrio do caminhante, agora temos com esse uma relação poética, de criação de si e da linha sobre a qual se caminha – o abismo não é senão o caos, e a linha demarca o território criado, um território de jogo, jogo da vida; linhas de vida, que se atravessam, se fazem e refazem em combinações infinitas. Constelações.

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